Entrudo

 

Cortejo Fúnebre do Rei Entrudo

 

De acordo com a tradição, participam neste cortejo: três homens ou rapazes vestidos de padres, com opas brancas, óculos e um livro aberto nas mãos, devendo o mais alto ir no meio, com a sua mitra alta, feita de papel ou cartolina; quatro gatos pingados que têm a função de pegar no caixão do defunto; um rapaz que faz de sacristão, levando uma grande cruz; um rapaz que leva a caldeirinha da água benta e o enxofre; seis rapazes levam archotes ou círios; cinco ou seis mulheres carpideiras, vestidas de preto, que, em voz alta, fazem clamores e uma grande choradeira; rapazes miúdos têm a função de chorar pelo avozinho.

  

O Cortejo inicia-se:
 

  Os Padres cantam:
Cumprimos o doloroso dever
De levar este irmão a enterrar
Ele já terminou a sua missão
Vamo-lo agora despachar.
 
 
  Segundo Padre:
Muito comeu e bebeu, até que faleceu.
Glória ao padre e ao espírito
Vai passar um grande tormento.
 
 
  Os Miúdos:
Ai o meu rico avozinho,
Que só queria boa comida e bom vinho

Durante a sua vida
Comeu com afinco
Mas nunca obrigou ninguém
A ter de apertar o cinto.

Nunca teve enfarte
Nem mesmo congestão
Por isso recomendava
Boa carne, chouriço e salpicão.

Nunca olhava a muitos gastos
Muito menos à poupança,
O que mais o interessava
Era encher bem a pança.
 

 
  Os Miúdos:
Ai o nosso querido avozinho,
Se for para o inferno,
Já não vai sozinho.
 
 
  Os Padres cantam:
Comia como um alarve
Sempre uma boa pratada
Mas neste seu dia
Só queria feijoada.
 
 
  As Carpideiras:
Aqui estão as carpideiras
Para cumprir nossa missão
Com lágrimas de crocodilo
Inundar o vosso coração.
 
 
  Os Padres:
Comei e bebei com muito cuidado
Porque a gula é o maior pecado.
É isto que vos aconselhamos
Mas não sei se é o que nós faremos.
 
 
  Os Miúdos:
Ai o nosso rico avozinho,
Se for para o inferno,
Já não vai sozinho.
 
 
  As Carpideiras:
Vamos deitar água benta
Para lavar os teus pecados
Não podes entrar no céu
Sem teres os pés lavados.
 
 
  Uma Carpideira:
Não sei se podes entrar no céu
Pois tens um pecado mortal
Nunca respeitaste a gula
Comias como um animal.
 
 
  A Pequena grita pelo Avozinho:
Agora se estás saciado
Tem então muita prudência
Amanhã é Quarta-Feira
É dia de abstinência.
 
 
  As Carpideiras:
Este nosso irmão
Foi bom camarada
Gostava de brincadeira
E de toda a coboiada.

Escolheu a Terça-Feira
Para o seu grande dia,
Comeu e bebeu à farta
É a sua ideologia.
 

 
  Os padres deitam as últimas bençãos:
Vamos rezar-lhe agora
A nossa última oração
Que rebente no inferno
Este grande glutão.
 
 
  Vão espargindo água benta
Primeiro Padre
:
Já deixámos o nosso irmão
Às portas do Purgatório
Com o bilhete de identidade
Como é obrigatório.

Em nome de São Lourenço
Digam-lhe adeus com o lenço
Em honra de São Mateus
Vai o nosso último adeus.

Fizemos-lhe grandes recomendações,
Com respeito à comida.
Como no inferno há muito calor,
Só água é permitida.

 

 
  Segundo Padre:
E nós que ainda aqui ficamos
Vamos ter muita cautela
Substituir a carne de porco
Por bifes de vitela.

Vamos beber uns copinhos
Sempre que haja lugar
Para nos nossos ofícios
Melhor podermos cantar.

Estamos isentos de gula
Não nos vamos preocupar
Só precisamos de missinhas
Para mais dinheiro ganhar.

Vamos rezar um Pai Nosso
E uma Avé-Maria
Pelos que mais se divertiram
No Carnaval deste dia.

 

 
  Todos:
Amen

Como este nosso amigo
Gostava tanto da pinguinha
Vamos lhe rezar uma oraçãozinha

Santa uva que vais na parreira
Santificada sejais sem enxofre
Venha a nós o vosso líquido
Para ser bebido à nossa vontade
Tanto na taberna como na nossa casa.

Um litro em cada hora nos dai hoje
Perdoai-nos as vezes que bebemos menos
Assim como nós perdoamos
Quando nos deixais cair na estrada
E livrai-nos, Senhor,
Da polícia a horas mortas.

Amen